segunda-feira, 10 de dezembro de 2007


“Aconteceu um prodígio durante a minha temporada escolar; e aconteceu tão repentinamente que ainda considero tal hora como uma hora de revelação. Foi num bonito dia de amena primavera, quando o ar estava repleto de cantos de pássaros e as cegonhas recompunham seus belos ninhos nos telhados dos casebres de barro. As águas haviam descido e novos rebentos verdes emergiam do chão. Em todos os jardins que tinham recebido sementes plantas brotavam. Era um dia que convidava à aventura, e era impossível permanecermos sentados quietos na velha varanda raquítica de Oneh onde os tijolos se desmantelavam ao menor contato. Eu estava riscando um destes símbolos perpétuos – letras a serem cortadas em pedra e traçando ao lado deles os sinais abreviados usados para serem escritos em cima de papel – quando de repente certa palavra esquecida de Oneh, determinado fulgor estranho dentro de mim, falou e deu vida àqueles caracteres. Os desenhos se tornaram uma palavra, a palavra uma sílaba e a sílaba uma letra. Quando juntei desenhos a desenhos novas palavras irromperam – palavras vivas, inteiramente distintas dos símbolos. Qualquer rústico pode compreender um desenho; mais dois juntos só têm sentido para um literato. Creio que quem quer que haja aprendido a escrever e a ler sabe que é que estou querendo dizer. Para mim tal experiência se tornou mais fascinante do que arrebatar uma romã o cesto de um vendedor de frutas; mais doce to que uma tâmara seca; tão deliciosa como para o sedento um bom gole d água.”

Mika Waltari em O Egípcio

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