sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

DELÍRIO DE HISTÓRIA

Pegamos o carro e voamos para uma praia deserta e incerta num local maravilhoso. Praia deserta de lobos e repleta de silêncio gostoso e rico. Arrancamos os sapatos e corremos as soltas, sem “lenço, sem documento”. A tarde exigia concentração... Nuvens brandas pairavam cismadas. Caímos na água, sem preocupação com hora e obrigações. A única obrigação era simplesmente esquecer do mundo, esquecer de si .

As ondas iniciaram um diálogo gentil. Quando nos demos conta da conversa, vimos-nos sobre a concha de Afrodite, num aquário literário. O sol queimava as idéias, fluíam versos clássicos. Num delírio vendaval, redemoinho escancarou Atlântida, o sonho perdido de Platão. Em túnicas de catassol, visões navegantes, daquele povo imerso na escuridão da história, festejavam a ilusão dos vivos. Permanecíamos na concha sob os olhos de Netuno e seu tridente. O filósofo sonhador o seguia. Sentimo-nos como simulacros de um passado insólito. Havia peixes de todas as formas e cores beijando ou rasgando as túnicas. Nossa, de repente a concha se choca com a estátua de Cleópatra!!!! O que estaria fazendo a lembrança da rainha poderosa imersa nestas águas tão distantes de Alkhemit? Tornara-se ela a rainha do mar? Salue, Júlio César! Agora és marinheiro? Suas sandálias também estarão por aí, calçando histórias no tempo? Após o solavanco da batida, encontramos, agitada, no remelexo das águas, a lâmpada de Aladim. Um peixe contou-nos que, inicialmente, a lâmpada pertenceu a Gilgamech, o primeiro construtor da Arca. Noé o plagiou... ou tomou a sua barca? Pegamos a lâmpada e a esfregamos. Tirando a tampa, encontramos um poema de Fernando Pessoa, O Último Sortilégio. Redemoinhos surgiram fervorosos... Vapores vulcânicos abriram alas na imensidão aquática. Atlântida ficou em polvorosa. Túnicas nervosas corriam sem salvação. Tempestade de H2O... Sal nos olhos. O Sortilégio estava concluído. Atlândida foi sumindo, calando-se num burburinho de bolhas de água espalhafatosas. O círculo mágico fora rompido. Estarrecidos, víamos a história fugir de nossas vistas. A concha da deusa se quebrou e caímos num poço sem fim... Náusea das alturas... Ishtar deu um grito brilhante! Babel despencou!

Caímos do carro solar e acordamos, numa parede, na postura hieroglífica na cena de Nefertiti com Amenhotep IV sob os raios de Aton.

Fecha-se o livro.

Cala-se a história.

Morrem os mundos.

Agora, é com Shiva!

(Texto: Lara J Lazo)

2 comentários:

Geraldo J. Costa Jr. disse...

E assim tudo começou. Com as bençãos de Aton, o Sol.
É daqueles texto que dá gosto ler porque nos faz enxergar cada detalhe de cada acontecimento descrito.
Show!

jacataca.com disse...

E como será que tudo terminará? se é que há um final...
Obrigada pel ocomentário!